sábado, 11 de outubro de 2014

Todos os Nomes

A minha crónica de hoje é a reprodução de um texto sobre o conceito de Nome. Encontrei-o numa página de uma rede social. É um pouco longo mas merece a pena fixar neste humilde espaço.


A palavra nome deriva do latim nomen, do verbo noscere ou gnoscere (conhecer ou ser conhecido). O nome é o sinal que caracteriza o indivíduo na família e na sociedade e o diferencia, ao lado de outros elementos de individualização, dos demais membros do grupo.
"Quando pronunciamos, ou ouvimos um nome, transmitimos ou recebemos, um conjunto de sons, que desperta no nosso espírito, e no de outrem, a idéia da pessoa indicada, com os seus atributos físicos, morais, jurídicos, económicos, etc. Por isso, é lícito afirmar que constitui o nome a mais simples, a mais geral e a mais prática forma de identificação". (Vampré:1935: 38)
O emprego do nome vem dos primórdios da humanidade, atendendo tanto ao interesse do indivíduo como ao da sociedade.
A conclusão dos cientistas, mestres da Sociologia, da História e do Direito, aponta que as origens do nome atribuído aos indivíduos confundem-se com as origens do homem.
Planiol, afirma que o nome entre os povos primitivos era único e individual; um só vocábulo designava as pessoas, que não os transmitiam aos seus descendentes. À medida que as pequenas comunidades sociais foram aumentando e as relações entre os indivíduos se tornaram mais complexas, foi necessário complementar o nome individual por restritivos que melhor caracterizassem o sujeito.
Entre os hebreus, em princípio, usava-se apenas um nome: ‘Sther (Ester), Rakhel (Raquel), David (Davi). Com o crescimento e a multiplicação das tribos, (surgindo muitos indivíduos), passaram a distingui-los com a indicação do respectivo progenitor: José Bar-Jacob ou José filho de Jacob. Igualmente, os nomes Bartimeu, Bartolomeu e Barrabás indicam, respectivamente, filho de Timeu, filho de Tolomeu e filho de Abas.
No Novo Testamento, na indicação dos apóstolos, encontramos Jacobus Zebedaei (Tiago de Zebedeu, filho de Zebedeu) e Pedro, Simão bar Iona (Simão, filho de Jonas).
Esse sistema também foi adoptado pelos árabes, que empregam a palavra ben, beni ou ibn, como se vê em Ali Ben Mustafá (Ali, filho de Mustafá), Faiçal ibn Saud (Faiçal, filho de Saud). Da mesma forma o costume dos russos, com as partículas vitch ou vicz para os homens e ovna para as mulheres: Nicolau, filho de Alexandre, é chamado de Nicolau Alexandrovitc e Catarina, filha de Pedro, chama-se Catarina Petrovna. Os romenos usam a partícula esco: Filipesco, Popesco; os ingleses acresciam a partícula son: Johnson, Nelson, Stevenson, Richardson, Stephenson. Outras partículas, que no português se assemelham a de, moço, filho, júnior, podemos citar: mac, costume irlandês e escocês; von, germânico; ski, polonês.
Os romanos aplicavam um sistema mais complexo, distinguindo, no nome completo, quatro elementos: o nomen, o praenomen, o cognomen e o agnomen. O nomen ou gentilício era o patronímico que designava os membros da gens (família). Logo, todos os que faziam parte da gens Cornelia se chamavam Cornelius. O praenomen, por sua vez, era o nome próprio, que identificava cada um dos membros da família.
O cognomen distinguia cada um dos ramos da gens. Logo, na gens Cornelia, destacava-se a família Scipio. Já o agnomen era um sobrenome individual e correspondia a facto notável da vida do possuidor. Exemplo clássico é o de Publius Cornelius Scipio, cujo agnomen era Africanus (Cipião, o Africano, que venceu o exército de Aníbal na 2ª guerra púnica).
Os estudiosos acreditam que esse sistema vigorou na Lusitânia – parte da península ibérica conquistada pelos romanos – até à invasão dos godos. Posteriormente passou-se a adoptar o nome de santos ou do padrinho, no acto do baptismo, donde o costume de chamar o nome  próprio de nome de baptismo. Mais tarde, nas famílias nobres, acresceu-se ao nome próprio o nome do progenitor: Afonso Henriques, filho de Henrique, Afonso Sanches, filho de Sancho, Lourenço Marques, filho de Marcos. Assim, os filhos de Nuno, Mendo, Gonçalo, Rodrigo, Pero, Fernando, Estêvão e Lopo chamavam-se, respectivamente, Nunes, Mendes, Gonçalves, Rodrigues, Peres, Fernandes, Esteves e Lopes.
Entre os plebeus de então e também dos cristãos-novos – judeus convertidos ao cristianismo por imposição do Rei de Portugal com ameaça de submetê-los à Inquisição e ao Santo Ofício - era o de acrescentar ao nome próprio, distintivos como nomes de árvores (Pinheiro, Laranjeira, Nogueira, Pereira, Macieira, Oliveira, Carvalho), de animais (Coelho, Barata, Cordeiro, Falcão, Carneiro, Lobo), de país (França), por características físicas (Belo, Barbudo, Bonito, Moreno, Feio, Vermelho, Branco, Gordo, Fortes, Direito, Rosado), de cidades (Lisboa, Porto, Toledo, Miranda, Navarro, Braga, Lamego, Abrantes, Coimbra), lugares (Campos, Jardim, Rios, Prado, Fonte Seca – Fonseca -, Vale, Lago, Monte) e de profissões (Ferreiro, Bispo, Guerreiro, Pastor). Essas alcunhas, transmitidas hereditariamente, foram paulatinamente convertendo-se em patronímicos, como hoje conhecemos.
Na idade média era comum também algumas famílias adoptarem sobrenomes de origem religiosa, na esperança de que estes nomes trouxessem saúde e prosperidade, além de afirmarem as suas posições como bons cristãos: Cruz, Santos, de Jesus.
Outras heranças onomásticas foram legadas de culturas do passado, como do latim: Antum (Antão), Anton (Antonio) e Antonius (Antonino), Benedictus (Benedito, Benito, Bento), Celestinus (Celestino), Clementinus (Clemente, Clementino), Lucius (Lúcio), Rufinus (Rufino); do grego:Athanasios (Atanásio), Nikolas (Nicolau), Estephanos (Estêvão), Chrysostomos (Crisóstomo), Andres (André); do hebraico: Hadad (Ada), Adoni Iah (Adonias), Dalilah (Dalila), Dani El (Daniel), Iehokhanan (João), Iehussef (José), Mátniah (Mateus), Miryam (Maria).
Existem e existiram alguns nomes estranhos ou pelo menos diferentes, nada comuns, que poderiam ser admitidos como aqueles que expõem o seu portador ao ridículo: Nacional Futuro da Pátria Provisório, Oceano Atlântico Linhares, Pedro Bispo Cardeal, Céu Azul de Castro Feijó, Américo Cesar de Almeida Cento-e-Três, Olindo Barba de Jesus, Crepúsculo dos Deuses Rodrigues, Antonio Manso Pacífico de Oliveira Sossegado, Céu Azul do Sol Poente, Joaquim Pinto Molhadinho, Antonio Carnaval Quaresma, Sebastião Salgado Doce, Antonio Noites e Dias... O Direito Romano adoptava o princípio da mutabilidade (Rerum enim vocabula immutabilia sunt, homimum mutabilia = porque os nomes das coisas são imutáveis, os dos homens, não), ou seja, as mudanças de nome eram livres salvo quando motivadas por alguma intenção fraudulenta. A tradição romana permaneceu durante a Idade Média, quando prevaleceu, como dito alhures, o sistema do nome único individual e, de modo geral, permitia-se a mudança.
A primeira legislação a impedir a mudança do nome foi a Ordenança de Amboise (1555). Na evolução subsequente o interesse público determinaria a estabilização do nome. Como marcos significativos refere-se, em França, cujo papel foi liderante, durante muito tempo, neste domínio, a Ordenança de Amboise, de 26 Mar. 1555, sob Henrique II, que proibiu a mudança de nome sem carta de dispensa e o Decreto da Convenção de 23 Ago. 1794, que revogando um decreto anterior que autorizava cada um a usar o nome que entendesse, proibiu o uso de nomes diversos dos resultantes do acto de nascimento. Anteriormente, um Decreto de 20 Set. 1792 veio fixar “o modo de constatar o estado civil dos cidadãos”, no que pode ser considerado como um primeiro embrião de registo civil. O Decreto de Fructidor II obrigou a que se usasse sempre e apenas o nome e o apelido constantes do acto de nascimento. A cúpula ficou completa com o Decreto de Germinal XI: admitia-se a mudança de nome, mas só com autorização do Governo. Estava consumado o controlo do Estado sobre o nome.

Conclui-se, sem maior esforço, a relevância do nome na vida humana. Tão importante o nome que até os objectos, os animais, as empresas, as ruas, o possuem. Sempre que conhecemos alguém, a primeira palavra que ouvimos é o seu nome. Todas as vezes que efectuamos uma chamada telefónica perguntamos o nome da pessoa que atende. Quando preenchemos uma ficha de inscrição, pesquisamos informações em órgãos públicos, a primeira pergunta é: qual o teu nome? Isso porque, como já dito, o nome é o sinal que identifica e individualiza a pessoa na sociedade e na família, constituindo direito da pessoa. Ele praticamente nasce com a pessoa e a acompanha durante toda a vida. Não se extingue com a morte. Pelo contrário: permanece vivo na memória daqueles que a conheceram. Sempre pelo nome o extinto será lembrado.
Como disse Goethe: "O nome de um homem não é como uma capa que lhe está sobre os ombros, pendente, e que pode ser tirada ou arrancada a bel prazer, mas uma peça de vestuário perfeitamente adaptada ou, como a pele, que cresceu junto com ele; ela não pode ser arrancada sem causar dor também ao homem".



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