Nos últimos trinta anos, a necessidade de ampliar a comunicação entre as pessoas tornou fértil o terreno das redes sociais.
E é no subsolo deste conceito que entram em cena as minhas raízes familiares, formatadas no mar, e nas ditas. Tornámo-nos cardumes vagueando pelos mares intercontinentais, explorando as redes, num entra e sai para quebrar a ociosidade.
No início, a rede era pequena. Dominava a pesca à linha ou ao corrido nos mails que nos inundavam a caixa com carradas de powerpoints e fotografias de tudo e mais alguma coisa.
Quase em simultâneo encetámos a descoberta do caminho digital para as mensagens de telemóvel, com figurinhas engendradas nos símbolos do teclado e textos de correntes morais que incitavam à partilha.
Eis senão quando aparece a primeira rede verdadeiramente social, o Hi5. Foi assim uma espécie de arte da xávega, limitada ao tamanho da rede, à profundidade e às ferramentas. O cardume arrumava-se por potências de 5, num esquema espiral, onde o nome contava pouco numa competição com o avatar mais apelativo e destravado.
Já o século tinha deixado a idade da lactância, apareceu o Facebook. A rede era de malha larga e o cardume desenvolveu uma variante da palavra amizade. A fotografia passou a ser obrigatória para se reconhecerem os amigos e as amigas. Mesmo que não se falem na rua ou no bairro, nesta rede todos partilham a retenida e o cerco cresce à conta das sugestões do algoritmo.
Já o oceano da comunicação se começava a compor de cardumes variados, alguns dos quais desconhecidos, apareceu o Twitter, uma rede mais larga e robusta para cardumes mais sofisticados e opinativos. Juntou peixes pequenos com peixes grandes. A hierarquia da cadeia alimentar ditou o elitismo de uns e a exacerbação no discurso de outros. Instalou-se um progressivo caos nas espécies.
O Instagram forneceu aos cardumes o espelho para se mirarem. Desde as mais rotineiras atividades como comer ou dormir às mais esquisitas ou mirabolantes aventuras, o cardume deixou-se apanhar pelos cliques das redes de emalhar. muito finas e transparentes, para dar a conhecer o seu modo de vida.
Os cardumes mais aventureiros e apreciadores de iscos elaborados encontraram no Tinder a rede apropriada para a continuação da espécie. A comunicação entrou no campo da relação íntima onde só importa o que é visível aos olhos. Valorizou-se o brilho da escama, o vermelho da guelra, a cor da barbatana, seja peitoral ou caudal.
Atualmente, e fazendo jus às preocupações com o meio ambiente e aos gritos de "Salvem o Planeta!", proclamou-se a biodiversidade e a rede afrouxou os seus nós, flexibilizou a malha e espraiou-se para as margens secas e arborizadas, permitindo a miragem da fusão do meio aquático com o terrestre. É a época da rede Mastodont. Libertária, sem bóias nem chumbos, oferece ao cardume a escolha de navegar ao sabor da maré e do vento.
Certamente outras se redes se seguirão, a menos que os cardumes desistam de comunicar e se enfiem em cavernas silenciosas.
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